
Parece que Miguel Castro e Silva andava um bocado ranzinza nos últimos tempos, contrariado porque o restaurante nunca mais abria e ele estava com saudades de cozinhar desde que se desligou do Bull & Bear e do BB Gourmet. Pois bem, esta semana fui almoçar duas vezes ao De Castro Elias
(na foto), nas Avenidas Novas lisboetas, e só posso dizer que a cidade ganhou mais um óptimo restaurante. Os admiradores alfacinhas, como eu, deste tripeiro de gema acabaram por ficar a ganhar com os infelizes percalços que atingiram um dos melhores e mais influentes cozinheiros portugueses dos últimos anos, trazendo a sua excelente cozinha mais para perto.
O De Castro Elias é pequeno (pouco mais de 30 lugares), com uma sala em profundidade, mas está muito bonito, pintado de branco e decorado com sobriedade e bom gosto, com copos, talheres e serviço de loiça (um dos aspectos em que Miguel Castro e Silva sempre destacou) de boa qualidade. A lista de pratos é muito baseada nos petiscos e nas porções que se partilham, lembrando o tipo de oferta da Tasca da Esquina, de Vítor Sobral. No entanto, ninguém pense que aqui há "cópias", apesar da amizade entre estes dois grandes chefes, porque me lembro, desde que houve a hipótese de Miguel Castro e Silva ir para o Tavares, que ele tinha a ambição de dar qualidade aos nossos petiscos (aos quais iria dedicar o primeiro andar do histórico restaurante lisboeta), que concretizou em parte no BB Gourmet.
Fui convidado para o primeiro almoço por um dos sócios da casa (que é meu amigo e a quem liguei uma hora antes para ir almoçar a qualquer sítio...) e por isso não só não paguei como deixei nas mãos do chefe o que íamos comer. Codornizes com um escabeche muito equilibrado, com a carne no ponto certo, fáceis de comer, umas originais "iscas" de bacalhau soberbamente fritas, moelas em molho picante (não muito) também com um ponto de cozedura perfeito e a célebre morcela da Beira Alta, de um fornecedor que há muito abastece a cozinha de Miguel Castro e Silva foram momentos altíssimos. Toda esta petiscaria é servida a preços que vão dos 2,70 aos 4,90 euros.
É sabido que os cozinheiros são uns chatos e basta dizermos não gostamos de uma certa coisa para eles dizerem logo "tens que provar os que eu faço". Foi isso que fez Miguel Castro e Silva quando lhe disse que podia servir o que quisesse menos pezinhos de coentrada....Mas realmente estes vêm desossados e sem cartilagens, muito saborosos. Não pediria de novo, mas realmente achei muito aceitáveis. Custam 6.80 euros e estão na parte dos "quentes" da casa, a preços que rondam os 10 euros. Ainda comi à sobremesa arroz doce, outro prato que não é da minha predilecção, mas aqui rendo-me: estava perfeito.
O chefe mostrou-me a cozinha que é pequena mas tem alguns bons equipamentos, permitindo-lhe cozinhar a baixas temperaturas, um dos pontos fortes da sua cozinha. No dia seguinte, apareci lá sem aviso, acompanhado por uma amiga jornalista, e Miguel Castro e Silva, que, naturalmente, está um pouco tenso e acha que o restaurante não está ainda "preparado", maldizeu-me e por sua vontade acho que me teria até expulsado...É claro que não lhe liguei nenhuma e pedi uma refeição mais canónica, deixando que o couvert (queijo fresco em cubinhos com azeitonas descaroçadas, muito bem temperado) servisse de entrada e dividindo um bife à café e um arroz de vitela com cogumelos, que apesar de caldoso, tinha os bagos num ponto perfeito. Tudo excelente e a repetir. Bebendo dois copos de vinho, uma garrafa de água e dois cafés, dividindo uma sobremesa, a conta ficou em 35,5 euros.
Por enquanto, o De Castro Elias fica aberto só entre as 12 h e as 19 h, com cozinha sempre aberta, fechando ao domingo. Fica no final da Av. Elias Garcia, no 180 B (tel. 21 7979214), já junto à Gulbenkian. Será sem dúvida um restaurante obrigatório com uma qualidade absoluta que o coloca entre os melhores da cidade e uma relação qualidade/preço quase imbatível. Das duas vezes a casa estava cheia e acredito que esta cozinha cheia de sabor e de saber vai ter muito êxito. Lisboa só pode agradecer que Miguel Castro e Silva esteja a cozinhar entre nós.