segunda-feira, 20 de julho de 2009

Sala com vista

Restaurante Tágide

Não há nada mais irritante do que ir a um restaurante com uma localização privilegiada e ser confrontado com a mediocridade. Como se esse factor por si só dispensasse o conteúdo. Como se a vista nos embriagasse os sentidos e não necessitássemos mais do que o básico para reconfortar o estômago. Que atire a primeira pedra quem não teve já este sentimento ao sair de um miradouro, ou de uma esplanada à beira Tejo - só para dar dois exemplos em Lisboa.

Foi por isso com agrado que há dias saí do Tágide com um sentimento de satisfação. Não porque neste local, com vista impar sobre a cidade, as propostas gastronómicas sejam fantásticas, mas porque, pelo menos, proporcionam uma refeição acima da média e por um preço atractivo.

O Tágide fica no Chiado num edifício que remonta à época pombalina. Enquanto restaurante existe desde 1973 tendo sido recentemente alvo uma remodelação na decoração, onde elementos contemporâneos passaram a conviver com valores históricos, como os lustres e os painéis de azulejo, ambos do século XVIII.



O restaurante funciona de terça-feira a sábado ao almoço e sextas-feiras e sábados também ao jantar. Existe um menu de almoço por 23€ (3 pratos) e um de jantar por 30€ (5 pratos). Com estes menus pretende-se uma boa aposta em termos de preço/qualidade, mas para quem quiser exceder-se um pouco mais tem à disposição, à carta, outras opções de escolha (mais em termos de pratos de carne, 6, do que de peixe, apenas 3 (aos quais acresce uma massa e um vegetariano, além das entradas e das sobremesas).

Neste local pratica-se uma cozinha de fusão de preponderância portuguesa, francesa, italiana e também de alguma influência oriental. No jantar que lá fizemos recentemente, a opção recaiu no menu. Primeiro, enquanto esperávamos a chegada dos pratos, fomos enganando a fome com pão e azeite e umas boas azeitonas marinadas com travo a orégãos e raspa de laranja.

Uma fresca e equilibrada Vichyssoise de camarão viria a ser o primeiro prato. Seguiu-se-lhe uma tosta com foie gras (“cuit”) acompanhada de figo, fresco e em compota, numa combinação agradável, embora algo comprometida por uma matéria-prima que não era de excelência, tal como não o era o lombo de robalo da proposta de peixe que veio de seguida. Neste caso, no entanto, é de realçar a excelente combinação com o acompanhamento de massa de arroz salteada com citronella, a dar um toque do sudoeste asiático ao conjunto. Como prato de carne tivemos bochechas de vitela com cannelloni recheados de puré de aipo bola. A cozedura lenta deu a devida maciez à carne e o acompanhamento, tal como no caso do peixe, revelou-se uma conjugação acertada, com o sabor particular do aipo a contrastar bem com o adocicado da carne. De sobremesa veio um gaspacho de frutos vermelhos com lima, demasiado ácido para o meu gosto.

O serviço e a parte dos vinhos são dois aspectos que devem ser melhorados. No primeiro caso o tempo de espera entre pratos deixou algo a desejar bem como um ou outro desacerto. No segundo, gostaríamos que o menu de vinhos que acompanha o menu de degustação fosse algo mais interessante do que a banalidade da trilogia Grandjó, Planalto e Esteva que nos serviram. É verdade que a carta de vinhos contempla várias opções de escolha, nomeadamente a copo. No entanto, mesmo tendo em mente o objectivo de se conseguir oferecer um preço de conjunto atractivo, existem outras hipóteses mais estimulantes. Por último deveriam ter maior atenção à temperatura de serviço dos vinhos, bem como aos copos (existem no mercado outros mais adequados por custo semelhante).

Apesar destes desacertos, facilmente remediáveis, o Tágide é um local a ter em conta. É que não é só uma questão de vista. Há na cozinha (e na equipa responsável) um esforço para superar a mediania predominante nos locais com localização privilegiada.


Contactos: Largo da Academia Nacional de Belas Artes, 18 e 20 (Chiado), Lisboa. (http://www.restaurantetagide.com/)

Texto publicado originalmente no suplemento Outlook (Diário Económico) em 18 Julho 2009

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